É sem dúvida mais um álbum clássico desta banda, me deixando em dúvida até os dias de hoje se este disco é o mais quebraceira de toda a discografia da banda ou não? Assim como cada disco do PEARL JAM tem algo ou alguma mensagem a dizer, este 2º álbum de estúdio lançado em 1993 se apresenta com uma mensagem e sonoridade enraizadas no volume mais alto possível, carregada de muito vigor, energia, explosão e fúria.
Como um processo natural das coisas, neste álbum já é possível verificar (musicalmente falando) a leve e sutil transformação de como o som do PEARL JAM foi nos apresentado no seu álbum de estreia em 1991 e de como ele estava se desenvolvendo até o ano de 1993. Aquele “funk rock” que permeia quase todo o álbum de estreia continua em evidência ainda no álbum “Versus”, mas com uma certa roupagem que, timidamente em algumas músicas e escancarado em outras, já começa a se confluir e a se moldar com o estilo de som das músicas quebraceiras que o PEARL JAM iria começar a criar. As canções em que esta germinação começa a aflorar seriam: “Go”, “Animal”, “Glorified G”, “W.M.A”, “Blood”, “Rats”, “Leash” (que por sinal, esta última música havia ficado de fora do álbum de estreia da banda, chamado “Ten”) e a música “Fuck Me in The Brain” (sendo que esta canção não entrou no álbum “Versus”).
Ao mesmo tempo em que esta influência “funk rock” da banda ainda insiste (no bom sentido) em não querer se desgarrar das suas origens (conforme foi exemplificado nas músicas citadas acima), eis que começa a aparecer timidamente àquela outra grande influência que permeia praticamente, ao lado do “heavy metal”, toda a base de bandas que surgiram no cenário de Seattle antes mesmo do “grunge” explodir no começo dos anos 90: o “punk rock”.
A estupenda música “Rearviewmirror” seria a que mais flerta com o “punk rock” neste 2º álbum, algo inédito até então nas composições desta banda mas que mesmo assim não se deixa ainda se entregar 100% ao punk. Muito devido também ao estilo de tocar bateria do Dave que é um baterista totalmente influenciado pelo jeito “funk rock” de tocar. Esta música possui os acordes clássicos (power chords) para tocar e para se levar uma música “punk rock” (apesar do belo riff de guitarra), mas a maneira que a bateria se comporta não nega ainda as origens da banda.
Abrindo um parênteses, até hoje não é muito bem explicado o porquê da saída/demissão do baterista do PEARL JAM, o Dave, depois que a banda gravou o seu 3º álbum de estúdio no final do ano de 1994. Muito se fala que ele e o Eddie não se davam bem, de que no final da turnê do 1º álbum de estúdio a banda já estava fermentando a ideia de se afastar dos holofotes da mídia, das entrevistas, das capas de revistas e de aparições televisivas, negando a regra máxima de terem que fazer vídeo-clips para a MTV também (lembrando que neste ainda 2º álbum da banda eles realmente resolveram não fazer nenhum vídeo-clip para a MTV).
Com várias leituras em livros autobiográficos e documentários que possuo, além de diversas pesquisas em sebos com leituras em revistas de rock das antigas e pesquisas cibernéticas, é possível perceber que o Dave queria justamente o contrário. Ele queria a fama, o sucesso, os holofotes…, e a música “Daughter” como o 1º single deste álbum por se tratar de uma canção de fácil audição. O que podemos deduzir também musicalmente falando, é que o estilo do Dave de tocar bateria batia de frente com o que a banda estava querendo explorar, ou digamos, querendo expor também nas suas raízes e nas futuras composições musicais da própria banda, porque apesar do Dave ter levado mais músicas no estilo “punk rock” no próximo 3º álbum de estúdio do grupo, é perceptível que a levada dele não chega a ser uma coisa fiel ao jeito punk de se tocar.
Este é um ponto muito interessante para se discutir, pois para muitos fãs o Dave foi o melhor baterista que tocou no PEARL JAM até hoje e enxergar este ponto de vista é algo totalmente plausível e que há de ser respeitado, ainda mais quando se trata de gostos, estilos pessoais e origens de uma pessoa referente à música. Mas às vezes não é só o lado musical que pode garantir a permanência de algum membro na banda. O lado pessoal, psicológico, objetivos próprios, relacionamentos e a maneira de como executar uma ação em conjunto, conta muito também…
Continuando a mesma receita de compor as letras para as suas músicas, naturalmente agora de uma forma mais aprimorada, neste álbum podemos também notar que algumas canções são relatadas sobre histórias de outros personagens, como as músicas “Daughter”, “Dissident”, “W.M.A”, “Elderly Woman Behind The Counter in a Small Town”, “Hold On”, “Hard to Imagine”, “Bee Girl” e “Hold Me” (sendo que estas 04 últimas canções foram pérolas que não entraram no álbum também).
Assim como temos as músicas que focam aquele aspecto geral da coisa possuindo um cunho social e político, que também é uma ideia remanescente do 1º álbum da banda, o álbum “Versus” nos apresenta as canções “Glorified G” e “Rats” que exemplificam muito bem esta postura. A letra da música “Glorified G” indica mais um indício do relacionamento/postura divergente que o Eddie (ou até a banda toda, vai saber) tinha em particular com o Dave. Pois um belo dia o Dave chegou ao estúdio aonde a banda estava gravando este álbum, com 02 armas e se glorificando com isso. O acontecido, o diálogo entre os membros da banda sobre este assunto, a posição do Eddie referente a isso e a confluência desse forte tema (porte de armas) inserido na sociedade americana, foi parar direto nas letras dessa música.
Deixando agora um parágrafo em especial, temos que relevar ainda as músicas que falam sobre o Eddie. A verdadeira arte de uma obra-prima, a verdadeira mensagem a ser captada pelo ouvinte, é aquela em que você interpreta a música da melhor maneira que lhe convêm, lhe abrindo um leque de sinapses e percepções diferentes a cada audição de uma determinada música, correndo junto com o ouvinte em cada momento e situação diferente que a pessoa está passando nesta vida. Dependendo do seu estado de humor, acontecimentos na sua vida, perdas, amor, frustrações e desejos a realizar, cada música vai lhe passar uma mensagem especial e única, que dependendo do que for ela não será errada e nem correta para todo mundo mas somente uma mensagem unitária para aquele ouvinte em especial. Este é o verdadeiro poder de uma música!
Pois bem, esta pequena introdução foi feita pelo fato de que as letras de algumas músicas desse álbum, desde quando eu o escutei pela 1ª vez lá em 1993 (assim como foi quando eu escutei o álbum “Ten” pela 1ª vez também lá em 1991 em uma fita cassete), sempre me soaram e foram interpretadas por mim de um tal jeito, mas que no decorrer dos anos eu comecei as enxergar de uma outra forma fazendo com que eu mudasse de opinião. As músicas “Go”, “Animal”, “Rearviewmirror”, “Leash” (aproveitando aqui para celebrar a juventude também nesta música) e “Indifference”, são um exemplo claro disso para mim. Antes, eram músicas que eu sempre interpretei como sendo também histórias de outros personagens, mas que com o passar dos anos eu comecei a vê-las como um desabafo do Eddie justamente contra a pressão da mídia, dos críticos musicais e das exigências da gravadora, sendo uma atitude de tentar limpar aquela neblina gerada pelos holofotes que cercavam o prisma da banda. Junto com a letra totalmente introspectiva e pessoal da música “Blood”, e com a música aqui já citada que acabou não entrando neste álbum, chamada “Fuck Me in The Brain”, seriam estas canções que estariam ainda tentando “libertar” o Eddie (até mesmo a banda como um todo) para iniciar o processo de procura do seu “eu” interior.
Estes seriam os primeiros passos dados em direção (ao que o Eddie iria reconhecer e entender mais tarde como uma parte do todo somente) à descoberta cristalizada da sua rota de fuga, que viria a sacramentar em um futuro álbum de estúdio desta banda ainda. Mas isto é assunto que este álbum em questão irá nos dizer mais tarde…
E outro sinal claro, quantitativamente falando, é de que já são mais músicas diretamente falando sobre o Eddie neste álbum do que no disco de estreia da banda, ou seja, mais picaretas para poder abrir e entender o muro que estava na sua frente naquele momento da sua vida e como ele poderia chegar ao outro lado…
Ainda é incrível, somando a todos estes pontos levantados (pressão externa, o baterista da banda e a negação por parte do grupo de cumprir vários “acordos” comerciais), a questão mais ainda sobre o local aonde foi feito a gravação deste álbum, que se iniciou em Seattle mas que foi tomando corpo e finalização em um estúdio na Califórnia, mais propriamente dito em um sítio. Isto deixou o Eddie muito nervoso, brabo e indignado com o local, lhe dando agonia e não conseguindo entender como era possível gravar um álbum de rock em um lugar daquele.
Juntando tudo isso e ocasionando na explosão da sua já marcante voz, o poder lírico que vislumbra do seu vocal vai cativando mais ainda o ouvinte a participar, entrar e assumir também para si as mensagens das letras e o seu papel inserido. Além da representação e fotografia viva de cada personagem nas suas respectivas poderosas músicas que este álbum nos proporciona também.
Esta capacidade única que o Eddie tem com a sua voz e performance foi muito marcante também no álbum de estreia desta banda, sendo um dos vários pontos fortes do álbum “Ten” que conseguiu cativar o seu público de imediato. Este dom continua mais do que presente no álbum “Versus” também.
No álbum “Versus” nós temos ainda um Eddie “amarrado” na situação em que a banda se apresentou ao mundo e de como que a banda teria que se comportar dali em diante perante aos seus empresários, exigências da gravadora e com as flechadas do mundo externo. Vemos um Eddie muito indignado com a situação em que ele se encontrou ainda sem apresentar uma rota de fuga (assim como foi no álbum de estreia), com a coleira que a banda teve que botar nos seus pescoços sendo “mandados” a se comportarem do jeito que o mainstream pedia.
Juntando isto que foi acabado de ser dito, mais com tudo o que já foi escrito nesta resenha, creio que o tema do álbum “Versus” pode ser resumido em uma palavra: confronto! Se no álbum de estreia o tema foi a palavra “traição”, a banda agora tomando consciência disso e sancionando o que havia para destilar, chegou agora a hora da reação, chegou a hora da atitude, chegou a hora do confronto! O nome deste álbum esmiúça muito bem essa ideia assim como o nome que o álbum “Versus” iria levar (que a princípio ele iria se chamar originalmente “Five Against One”).
E também após o lançamento deste álbum, mais precisamente em 1994, a banda resolveu cancelar a sua turnê de verão devido ao monopólio da Ticketmaster que ocasionou performances, logísticas, promoções, anúncios e despesas dos shows tudo por conta própria da banda, além da presença da mesma em tribunais (essa história da Ticketmaster já é de conhecimento de todos, por isso que não será aqui detalhada e analisada mais a fundo, ok)? Mais uma reação da banda dentre várias citadas nesta resenha, mais um tipo de confronto.
Novamente, agora um pouco mais aflito e tentando ser um pouco mais claro do que foi no 1º álbum, o Eddie está tentando buscar uma rota de fuga para os seus problemas existenciais e para a posição a tomar pela banda perante a toda esta miscelânea, mas de novo, ele não a encontra ainda. O que ele encontra e relata, também, é a podridão que a sociedade é em situações recíprocas e empíricas do nosso dia a dia, além dos relacionamentos emocionais entre si também (sendo que a música “Rats” exemplifica muito bem esta questão, fazendo a correlação da vivência dos ratos com a sociedade humana). A catarse ainda não é totalmente intelectual neste álbum, ela ainda é emocional com um mais do que poderoso e sônico imediatismo.
Mudando de assunto agora, assim como já aconteceu no 1º álbum da banda e que me chama muita atenção em destacar, mais uma vez podemos verificar uma música no álbum “Versus” que possui aquela levada tribal que iria ficar marcado em toda a discografia desta banda. A canção “W.M.A” representa muito bem esta faceta deixando-a única e singular assim como cada música com levada tribal, ou somente nas percussões, que esta banda nos apresenta em toda a sua discografia. Aqui, a canção caminha sobre um andamento mais agressivo com a levada das guitarras e do baixo se apresentando de uma forma espetacular que vai permeando por toda a música. Ela também nos proporciona uma letra verídica e fatal, misturando tanto a história de um personagem com a sistematização arcaica e racista da polícia, da política e da sociedade em geral. Bela música tribal que, graças ao baixo do Jeff, também flerta com o “funk rock”.
Caminhando agora para o final desta resenha, falta ainda destacar 04 músicas que não entraram no álbum “Versus” e que ainda não foram citadas também. A 1ª seria a música “Angel”, uma música lenta, bonita e tranquila, mas que o lado musical não reflete o que a letra desta canção quer dizer. Uma questão muito interessante com esta música é que a mensagem dela seria ainda uma continuação do que já vinha sendo dito no 1º álbum do PEARL JAM. Se me permitem fazer três citações de mim mesmo retirada da resenha do álbum “Ten”, onde eu digo: “desde o início havia uma dimensão social/política na música que o PEARL JAM fazia, um desejo e uma necessidade de confrontar o mundo exterior e assim tentar desvendar o que aconteceu de errado, o porquê de não estarmos vivendo o que nos foi prometido quando éramos crianças, e, acima de tudo, descobrir o que podemos fazer com relação a isso…” “…a música do início dos anos 90 foi escrita para os filhos cujo pais eram jovens/adultos na geração de meados dos anos 60 e da década de 70. Este período foi um dos grandes picos da onda do rock, onde a música tentava com todas as forças ser transformativa, tentava corrigir os erros do mundo (Vietnã, vou dar um exemplo somente) e servir como fonte de inspiração e emoção para as pessoas…” “…a geração do início dos anos 90 cresceu em meio a essa falha na revolução proposta pelos seus pais. Essa nova geração sentiu-se de alguma forma traída, havia a sensação de que uma grande promessa havia sido perdida e que as pessoas não tinham ideia para onde ela foi e o que aconteceria dali em diante…” Ou seja, o tema que a letra da música “Angel” aborda vai de encontro, conforme uma flecha que voa até o seu alvo, com o tema do álbum “Ten”.
A 2ª música é a instrumental “Cready Stomp”. Como será que esta música teria se comportado se o Eddie tivesse colocado os seus vocais nela? Assim como aconteceu com a música “Angel” pelas suas letras, a levada desta música instrumental nos remete e muito também ao estilo das músicas quebraceiras do álbum “Ten”.
A 3ª música seria a já citada aqui nesta resenha chamada “Hold On”, mas que nos apresenta além da sua versão elétrica, uma versão linda acústica que independente de qual versão seja, a audição de ambas imediatamente remetem ao ouvinte aquela mesma atmosfera e clima que marcou essa época, com o prisma da nostalgia e do saudosismo do começo dos anos 90 à flor da pele. A versão elétrica representa muito bem como era o estilo das músicas quebraceiras que o Pearl Jam tocava nas antigas também, antes do “punk rock” chegar de uma forma bem característica nas composições das suas músicas.
E a 4ª e última música a destacar seria o cover mais que batizado pelo jeito PEARL JAM de ser da música “Crazy Mary”. Canção composta pela cantora americana Victoria Williams.
Uma obra de arte, dentre vários conceitos e simbolismos, é marcada também pela fotografia que ela nos remete à nossa mente e pela cápsula do tempo em que o ouvinte vai de encontro quando se comenta em uma conversa sobre o álbum “Versus”. De imediato é estampado na mente e realmente fica marcado na vida de um fã, como por exemplo, o vocal soturno de introdução e as viradas da bateria que acontecem no finalzinho da música com o volume abaixando na música “Rats”, ou os riffs e o solo marcantes das guitarras do Stone e do Mike na música “Leash”, o grito imensurável e inigualável do Eddie na música “Rearviewmirror”, os suspiros introspectivos chegando ao ponto de se ouvir a respiração do vocal na música “Indifference”, e o que dizer da bateria de introdução da música que abre o álbum, chamada “Go”? Por falar em bateria, bela batera no final da música “Blood” também!
São estes lampejos e várias outros sintomas inconscientes que, temperado nisto tudo, não é muito difícil de se ouvir também no decorrer deste álbum as influências do guitarrista da banda, o Mike, pela guitarra psicodélica do JIMI HENDRIX. Principalmente nos seus solos…
Nota: O álbum “Versus”, que já é de conhecimento de todos os fãs do PEARL JAM, na 1ª semana do seu lançamento vendeu mais de 950 mil cópias só nos EUA, superando todos os demais álbuns combinados que faziam parte do Top 10 da Billboard daquela época. Isto definiu um recorde na história do rock’n roll que foi mantido por 05 anos, além de também ter ocupado o 1º lugar da Billboard durante 05 semanas. Mas somente entre álbuns de rock, este recorde só foi quebrado depois de 07 anos após o seu lançamento. Além disso, é um dos poucos discos que conseguiram a proeza de ranquear músicas na lista da Billboard que não foram singles deste álbum.
[to_like]
Track-list:
1- Go
2- Animal
3- Daughter
4- Glorified G.
5- Dissident
6- W.M.A.
7- Blood
8- Rearviewmirror
9- Rats
10- Elderly Woman Behind The Counter in a Small Town
11- Leash
12- Indifference
[/to_like]